Marisa Flórido
Fernanda Leme pinta a partir das fotografias que faz com o celular, ou de seu arquivo pessoal ou extraídas das mídias. A essas imagens mesclam- se outras de sua imaginação, dos resíduos da memória, de elementos da contemporaneidade, em um processo de montagem e edição.
Na superfície da tela, tempos e espaços diversos, imagens e narrativas por vezes díspares e dúbias. Trata-se, para a artista, de retirar as imagens do fluxo frenético das redes ou do imediatismo com que as consumimos. A exposição de si e a conexão tornaram-se compulsivas; os vínculos afetivos, dependentes dos impulsos eletrônicos, do on/off das ligações tecnológicas: precisa-se delas para existir e se ligar aos fluxos do mundo, mesmo que seja na fantasmagoria das redes.
No políptico exposto na mostra, cenas de livros infantis, de desenhos animados, misturam-se a retratos de viagem tão comuns nas redes sociais. Mas sob a paleta explosiva e esfuziante, em concordância com a cena feliz, insinua-se algo sinistro como um sintoma, como um mal-estar coletivo que assombra estes tempos.
Complexidade e paradoxos emergem em suas telas.
Por isso a interrogação da artista: “é possível encarnar o coletivo em imagens íntimas e pessoais, como uma visitação, como a fecundação do outro em minha imagem?”